Brasileiros demoram, em média, 39 meses – ou seja, 3 anos
e 3 meses – para procurar ajuda médica para tratamento de depressão. O dado faz
parte de um levantamento realizado pelo Instituto Ipsos, a pedido da empresa
farmacêutica Janssen, que ouviu 800 pessoas com ou sem relação com a depressão
de 11 estados brasileiros. Apesar de os pensamentos suicidas terem incomodado
cerca de 4 em cada 10 respondentes antes de buscar o diagnóstico, a demora em
procurar ajuda especializada ocorreu, principalmente, pela falta de consciência
de se tratar de uma doença (18%), por resistência (13%) e medo do julgamento,
da reação dos outros ou vergonha (13%).
Os dados foram apresentados em um workshop realizado no último dia 14 em São Paulo, onde especialistas no assunto falaram sobre a
“Urgência da saúde mental: um outro olhar sobre a depressão”.
Segundo a professora de psiquiatria da Faculdade de
Medicina do ABC Cintia de Azevedo Marques Périco, a demora na busca por
tratamento para a depressão pode trazer sérias consequências ao paciente.
“O agravamento dos sintomas, a diminuição da eficácia dos
tratamentos, a perda de anos produtivos, o impacto econômico e a severa
diminuição da produtividade, e ainda prejuízo em seu convívio familiar e social
são consequências da doença. A depressão precisa ser levada à sério”, afirmou
Cíntia que também é integrante da Comissão de Emergenciais Psiquiátricas da
Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
Dados da pesquisa demonstram ainda que há falta de
entendimento das pessoas sobre a gravidade da doença e sobre seu impacto na
vida do paciente e de todos ao seu redor. Apenas 10% acreditam que a depressão
é uma doença com base biológica (e repercussões físicas no corpo). Outros 35%
acham que a enfermidade não pode ser tratada com medicamento e 36% acreditam
que, para superar a doença, é preciso força de vontade.
Outro estudo recente, publicado na revista The
Lancet, aponta que até 80% das pessoas afetadas pela doença no mundo sequer
sabem de seu diagnóstico.
Emergência psiquiátrica
Atualmente, a depressão é considerada uma emergência
psiquiátrica devido a sua relação com casos de suicídios e tentativas de
autoextermínio.
Estudos apontam que cerca de 97% dos suicídios têm
ligação com transtornos mentais, especialmente a
depressão.
Apenas no estado de São Paulo, o Corpo de Bombeiros
contabiliza, em média, sete tentativas de suicídio diárias.
“Esses números são ainda mais altos, pois não estamos
levando em conta as ocorrências do Samu e da Política Militar. Em muitos casos,
suicídios poderiam ser evitados se as pessoas tivessem um olhar mais
humanizado, reconhecendo a depressão como um transtorno mental que precisa de
atendimento urgente e especializado”, disse o major Diógenes Munhoz que
trabalha na corporação há 22 anos e atuou diretamente em 57 ocorrências de
tentativas de suicídio.
O major é ainda idealizador da Técnica Humanizada de
Abordagem a Tentativas de Suicídio admitida e usada em mais de 17
estados pelo Corpo de Bombeiros.
Depressão resistente ao tratamento
Em todo o mundo, especialistas têm estudado o crescimento
de casos de pacientes com depressão resistente ao tratamento (DRT). Isso ocorre
quando não há resposta satisfatória para, pelo menos, dois
tratamentos anteriores administrados em dose e tempo adequados. Em geral, esses
pacientes também apresentam ideação suicida.
A depressão resistente ao tratamento (DRT) é um
transtorno que impacta cerca de 40% dos pacientes brasileiros, segundo dados do
estudo observacional TRAL (Treatment-Resistant Depression in America Latina),
realizado na América Latina com quase 1,5 mil pacientes. Estudos apontam que
pacientes com depressão podem ter um custo direto de 30% a 250%
superior aos dos pacientes sem o transtorno, em casos de DRT, esse custo pode
ser ainda superior, chegando a um valor 400% maior.
Durante o workshop, os especialistas destacaram um novo
medicamento para os casos resistentes que foi aprovado pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no final de 2019. De uso intranasal,
o Spravato atua em uma nova via de neurotransmissores e deve ser aplicado
em um ambiente hospitalar, segundo o professor de psiquiatria da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Humberto Corrêa, que
liderou a condução de um dos estudos com o medicamento no Brasil.
“Pode ser um hospital dia, uma clínica de infusão ou um
hospital propriamente. O paciente não tem acesso direto ao medicamento, não sai
com uma receita do consultório para ir à farmácia comprar. É a instituição
hospitalar que providencia o medicamento e o profissional de saúde aplica no
paciente que volta para casa após a aplicação”.
O Brasil é o quinto país com mais incidência de depressão
no mundo, apresentando um número de casos superior ao de diabetes, segundo
Pesquisa Vigitel 2021, do Ministério da Saúde.
De 2011 a 2019, a Agência Nacional de Saúde Suplementar
(ANS) calculou um aumento de 167% na utilização de serviços relacionados à
saúde mental.
Edição: Lílian Beraldo